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quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009
Psicopedagogia e desestrutura sócio-familiar
Chafic Jbeili – www.chafic.com.br
Escrever sobre este tema foi mesmo desafiador. Vasculhei várias épocas da história e revirei algumas pesquisas que realizei anos atrás sobre algumas tradições culturais. Fiz uma revisão nos fundamentos do espírito democrático enfatizado na tese político-social do Barão de Montesquieu, por meio de sua obra “O espírito das leis”, pois suas idéias inspiraram a Revolução Francesa fazendo prevalecer em quase todos os sistemas governamentais os princípios do Estado de Direito Democrático.
Por incrível que pareça a mudança de Monarquia e Imperialismo para Democracia impactou as formas de governo das famílias na idade média e, desde então, o “Chefe” de família perdeu sua soberania patriarcal para o sistema de gestão familiar compartilhada, seguindo o novo modelo de governo de sua pátria.
No Estado Democrático, o poder foi dividido em três: executivo, legislativo e judiciário. Nas famílias também: Pai, mãe e filhos agora compartilham poderes e direitos iguais. Embora mais justo e ideal, a tripartição tanto do poder estatal quanto do poder familiar não deixa de ter seus efeitos colaterais, ainda mais quando há sobreposição de funções e papéis, como nos casos de famílias monoparentais.
Pelo menos agora há mais pessoas em quem colocar a culpa quando algo sai errado no Governo ou na família. Há mais possibilidades de justificativas quando governantes e pais não querem assumir responsabilidades, transferindo-as aos membros do próprio Governo ou da própria família e, variavelmente, até para os professores e sistema educacional.
Enfim, vários foram os fatores que ao longo da história abalaram e até os dias atuais continuam abalando as estruturas familiares. Desde mudanças climáticas, guerras, transição de governos, recessões, separações, disputas por terras e heranças, mortes, álcool, drogas, doenças, miséria, religião, bancarrota, modismos e até mesmo disparidades culturais entre cônjuges causaram e ainda causam, de alguma forma, impacto negativo na estrutura das famílias; de modo que não há como proteger cabalmente qualquer grupo familiar, nem eximí-lo de sofrer ataques do que quer que seja.
Por alguns instantes, no calor da reflexão, cheguei a pensar que a família estaria entrando em extinção. Mas não é bem isto! Na verdade, a família está sofrendo um processo de metamorfose e em algum momento se estabilizará em seus novos e variados formatos. Enquanto isto, não se pode exigir da família o que não se exigiria de uma criança em processo de desenvolvimento. Não se pode impedir mudanças, transformações, transmutações da célua familiar. A natureza humana sempre encontra um meio de se organizar no meio da bagunça, de forma que a vida é uma alternância entre caos e ordem.
Mas o que fazer com as crianças com dificuldades de aprendizagem e professores com dificuldades de ensinagem, enquanto estatísticas apontam a desestrutura familiar como principal causa do fracasso escolar?
Certa vez uma criança brincava na sala com seu quebra-cabeça geográfico. Ela já havia montado e desmontado várias vezes aquele brinquedo, cujo tema era o nosso lindo e grande planeta azul, girando suave no infinito Universo.
O pai, em seu dia de folga, se ofereceu para brincar com a criança e começou a encaixar as peças em processo contínuo de tentativa e erro. Depois de alguns momentos, o pai diz para o filho que parecia haver peças faltando. Foi quando a criança pegou as peças, virou uma a uma e em menos de um minuto montou todo o quebra cabeça, pelo verso. Desvirou tudo com cuidado e lá estava o Planeta Terra, perfeita e extraordinariamente montado. Boquiaberto, o pai pergunta ao filho como ele havia conseguido realizar aquela proeza, e o menino respondeu:
- Pai, é muito fácil! No verso tem a figura de um homem. Arrume primeiro o homem do lado de cá que o planeta se ajeitará automaticamente do lado de lá. Fantástico! Porque não havia pensado nisto antes?
Da história do quebra-cabeça podemos tirar pelo menos uma lição primordial sobre o papel do psicopedagogo no contexto da desestrutura familiar:
Devemos nos ocupar em “arrumar” o homem, a criança, o ser aprendente que nos chega para avaliações, antes de almejar inócuamente reestruturar sua família. Mesmo porque psicopedagogo não é terapeuta de família e, portanto, deve se limitar a orientar pais e responsáveis aos procedimentos necessários para potencializar e reforçar processos ensino-aprendizagem. Identificada necessidade de intervenção em outras especialidades, proceda encaminhamento a tantos profissionais quanto forem necessários, mantendo sempre o coração e a mente tranqüilos de que está fazendo o que é certo e adequado para a saúde de seu cliente.
Que outras lições você pode tirar da história?
Sabe-se que o psicopedagogo é o profissional multidisciplinar que diagnostica e intervém nas dificuldades e nas facilidades de aprendizagem ou ensinagem. Atua no campo clínico diretamente com pessoas detentoras de alguma queixa correlacionada ao processo ensino-aprendizagem; atua também junto às organizações no âmbito institucional. A psicopedagogia é a ciência da profilaxia e deve trabalhar preventivamente, antes que seja necessário intervir.
Na ótica da psicopedagogia institucional, o psicopedagogo precisa ser adepto da visão sistêmica e cuidar para que o contexto ensino-aprendizagem esteja carregado de valores e crenças que fortalecerão educandos, enquanto pessoas, e os prepararão para fortalecer suas famílias atuais e, principalmente, aquelas células familiares que eles irão formar ou integrar no futuro. A família é o reflexo de seus membros! Membros saudáveis, família saudável. Promova ações educacionais na escola que valorizam a família, as virtudes e o respeito mútuo.
À Educação também compete formar a pessoa para o exercício da cidadania, logo a Escola não pode se eximir da responsabilidade em lecionar valores sociais e isto não quer dizer que estará assumindo papéis que são prerrogativas de pais e mães. Aproveite toda oportunidade que tiver para transmitir valores morais e cívicos. Alguém alertou: "Eduque as crianças para que não seja preciso punir os homens". Eduque as crianças para que no futuro haja menos familias desestruturadas.
Não deixe falar mal de casamento, de igreja, de homens e mulheres. Por pior que eventualmente tenham sido suas experiências, estas instituições ainda permeiam nosso inconsciente coletivo e têem impacto direto sobre a qualidade da estrutura familiar.
Enquanto educadores e educacionistas que somos, defendemos a tese de que somente a Educação pode mudar a condição social do homem e transformá-lo em uma pessoa melhor preparada para a vida, mas o que estamos fazendo para provocar esta transformação? Lecionando disciplinas curriculares isentas de teor moral, sob a desculpa de que este é o papel da família? Formamos exímios pedagogos, matemáticos, engenheiros, advogados, médicos, psicopedagogos, mas esquecemos o cidadão, a pessoa que vem antes do pedagogo, do matemático, do engenheiro, do advogado, do médico, do policial, do político...
Cada educando passa em média 14 anos de sua vida em instituições escolares e acadêmicas. Assim, cada educador e cada psicopedagogo, entre outros tantos profissionais que estão na Área da Educação lidando com aprendentes oriundos de todos os tipos de famílias, devem primar por incluir valores morais em suas ações didáticas, pedagógicas ou interventivas.
Se crianças estão crescendo sem referências adequadas em suas células familiares desestruturadas, que não seja a Escola, nem professores que as privarão de tais referenciais, tão imprescindíveis para a estruturação e formação do cidadão de bem e, por conseguinte, das famílias adequadamente estruturadas e preparadas para influenciar positivamente seus membros.
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