A essência e condição humanas.
Prof. Chafic Jbeili
Sabe, às vezes fico pensando sobre a essência e condição humanas, no intuito de convencer-me de que as pessoas estão melhorando enquanto evoluem ao longo do tempo. Quero acreditar que a tecnologia e as facilidades modernas, bem como as políticas humanitárias e os avanços das ciências médicas, psicológicas e sociais têm tido significante importância na evolução dos homens. Eu preciso acreditar nisto, mais até do que provar que isto é verdade!
A medicina avança e as pessoas têm vivido cada vez mais e com melhor qualidade de vida. As doenças sérias estão sob algum controle e as epidemias são mais facilmente contidas. A biomedicina e a medicina genética rompem as fronteiras do DNA para prevenir doenças congênitas, imprimindo uma nova dimensão na cura e tratamento das enfermidades.
No âmbito espiritual, vejo a proliferação de igrejas e o aumento extraordinário de fiéis em busca de um estilo de vida diferenciado. O movimento de evangelistas em todas as religiões tem trilhado caminhos cada vez mais longínquos, levando doenças como gripe, mas também urbanidade, civilização e a Palavra e Deus a povos até então isolados e excluídos do restante do mundo.
O terceiro setor se expande e intensifica as ações sociais de causas humanísticas. Vários programas sociais e ambientais estão sendo desenvolvidos em todo o mundo. Desde a proteção dos direitos indígenas, passando pelo combate do tráfico de animais silvestres até adoção de árvores na Floresta Amazônica como meio de prevenir o desmatamento.
Artistas e famosos se mobilizam em campanhas internacionais. Angelina Jolie com seu projeto de ajuda humanitária na deslumbrante, mas mal explorada África. Al Gore viajou o mundo divulgando o premiado documentário sobre aquecimento global “Uma verdade inconveniente”. Outros tantos ilustres lançam camisetas, chinelos, fitinhas, perfumes e todo o tipo de produto com finalidade de ajuda comunitária focada em uma bandeira: combate ao câncer de mama, combate a AIDS, defesa da mulher, entre outros.
Dezenas de empresários perceberam que ter uma razão social não apenas como nome, mas como objetivo de suas empresas é um grande negócio, e então passaram a investir em programas sociais como diferencial competitivo. A consciência ecológica tem gerado demanda por novas profissões, desafiando o mercado de trabalho futuro na criação de produtos cada vez mais alinhando com a política da portabilidade, sem ferir a sustentabilidade.
Enquanto isto, o mundo vivencia uma explosão demográfica. A população mundial cresceu nos últimos 400 anos mais do que em toda a história do mundo. A linha de desenvolvimento se verticaliza e os números se alteram para mais, assustadoramente. O crescimento populacional é tão grande que especialistas prevêem escassez de água e alimento em pouco tempo, cerca de 100 anos para se instalar o caos se nada for feito agora.
Todo lugar que se pode ir, está sempre super lotado. Seja no trânsito, seja no supermercado, no salão, nos bancos, nos cartórios e até na padaria o que se vê são filas enormes e congestionamento de carros, carrinhos e pessoas. O que há pouco tempo podia-se fazer com 15 minutos, atualmente não se faz com menos de 30, 40 ou até uma hora, às vezes mais.
A alta população gera altas demandas por produtos e serviços. A demanda elevada faz aumentar os preços. Isto quer dizer que as coisas estarão cada vez mais caras e mais difíceis de adquirir. Esta verdade é encoberta pela facilidade do crediário que faz aproximar os bens às pessoas, mas as deixam endividadas e escravas do débito. O débito, por sua vez é o que garante os lucros e a sobrevivência das instituições financeiras. O débito é as correntes modernas que aprisionam os cidadãos em seus próprios desejos, tornando-o mais infeliz e inseguro, para gerar-lhe ansiedade e fazê-lo querer mais dinheiro para poder comprar mais, mas sem que ele perceba isto, é claro!
Enfim, não é necessário pesquisar muito para perceber que embora tenham surgido novas tecnologias, produtos e serviços, a essência e condição humana não evoluiu quase nada em termos qualitativos. Aprendemos a dominar o fogo e como esquentar o planeta, provocando a natureza que nos retribui furiosamente com seus tsunamis, tornados e terremotos cada vez mais intensos e freqüentes. Aprimoramos nossos carros e nossas armas.
Mudamos as coisas antigas e criamos outras novas sim, mas não conseguimos mudar as pessoas. Caim continua matando Abel; Édipo continua matando Laio; Hitler continua conquistando adeptos; muitas pessoas continuam clamando pela libertação de Bahabás em troca da crucificação de Cristo; César continua esbanjando seu poder político e o seu parlamento continua sustentando a corrupção, enquanto fingem fazer Leis em favor do povo. Tudo isto acontece bem debaixo do nariz da Justiça que continua de olhos vendados para o povo vendido.
Proporcionalmente, há mais penitenciárias hoje do que havia há 100 anos, muito mais do que havia há 500 anos. Isto quer dizer que o número de bandidos têm aumentado em relação a população, provando que toda evolução nos âmbitos industrial, político, das ciências médicas, psicológicas, sociais e religiosa não tem tido efeito significante sobre a mudança na essência e na condição humanas.
A tendência para o mal prevalece no coração e na mente dos homens, contra os próprios homens e seu habitat. A história prova que não há nada que possa ser industrialmente produzido ou politicamente estabelecido que faça mudar o cerne da índole humana. O mundo jaz no maligno!
A barulheira e a inquietação que o mundo vive e privilegia é, na verdade, a manifestação de um mecanismo do ego angustiado, ao qual Freud chamou de “fuga”. A neurose social atual que causa o presente mal estar na civilização é o desejo e tentativa de fugir de tudo aquilo que o próprio homem vem criando ao longo dos séculos.
Esta reflexão me faz lembrar a história dos cupins que para se manter vivos, decidiram comer a madeira do barco que os livrava de uma inundação. Na verdade, os cupins não detinham o poder sobre o próprio destino, mas podiam decidir como viveriam até que o destino os alcançasse. Uns cupins se esbaldavam comendo a porção dos outros, enquanto uns tentavam fazer aquela experiência o menos sofrível possível.
Assim somos nós, os humanos: nada do que possamos criar modificará o nosso destino, mas podemos mudar a forma como interagimos até que o nosso tempo chegue. Uns se esbaldam e dedicam-se tomar a porção que pertence a outrem, enquanto muitos dedicam sua vida na expectativa de tornar a experiência de seus semelhantes mais prazerosa, feliz e produtiva quanto for possível.
Prof. Chafic Jbeili
Psicanalista e Psicopedagogo
Diretor e editor Chafic.com.br - www.chafic.com.br
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quinta-feira, 3 de dezembro de 2009
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